Artigo_Alecrineiros26
Algares do Cabeço dos Alecrineiros - Parte XXVI
2 de Maio de 2021

Ribeiro, José 1,2; Lopes, Samuel 1,4; Rodrigues, Paulo 1,2,3

  1. Grupo de Espeleologia e Montanhismo, Rua Maria Veleda, 6, 7ª Esq, 2650-186 Amadora, Portugal
  2. Núcleo dos Amigos das Lapas Grutas e Algares 
  3. Comissão Científica da Federação Portuguesa de Espeleologia
  4. Wind-CAM – Centro de Atividades de Montanha, Rua Eduardo Mondelane, lj44, 2835-116 Baixa da Banheira

 

Introdução

No seguimento de muita prospeção feita ao longo das ultimas saídas apresentamos mais alguns algares, a saber: Algar do S, Buraco do Zé de Gatas, Algar Tudo Legal, Algar do Jalles, Buraco das Bolotas e Algar das 2 Salas.
Figura 1 - Localização dos algares, tendo como referência o cruzamento conhecido na zona como "Os 4 caminhos", assinalado com seta vermelha.

Adverte-se também e mais uma vez que, para sua proteção e da própria cavidade, o espeleólogo tem de ter obrigatoriamente formação!!!

Algar do S
Felizmente tínhamos várias equipas no terreno, uma delas veio para perto da zona do Algar da Bajanca e valeu o tempo, pois ficou a zona um pouco mais preenchida.
Descrição:
Figura 2 – Entrada do Algar do S (Foto: Marta Sequeira – GEM)
Algar com duas zonas bem distintas. Inicialmente o algar abre-se à superfície, em zona por nós escolhida para descer, com abertura aproximadamente de 1,5m x 1m, seguindo-se um poço de 5m com base de muito calhau e argila e paredes forradas de musgo. No Sentido NNO a progressão é a subir e verifica-se que a zona está a “céu aberto”, se assim podemos dizer, numa zona mais larga com forte silvado. Já na sua zona mais elevada a direção de progressão muda no sentido NO, aparecendo novamente o teto. Um pouco mais à frente nesta pequena sala vemos uma chaminé com aproximadamente 2m, já o chão é de calhaus de várias dimensões, sendo a progressão descendente no sentido NO, onde no final existe um pequeno recanto, terminando ai este tramo do algar.
 
Regressando ao poço de entrada e agora no sentido S, a progressão é em fenda, sendo esta alta e estreita mas permitindo boa progressão. Paredes com algumas formas de reconstrução e chão de cascalheira, o algar vai-se desenvolvendo descendo no sentido de progressão, mais à frente vira no sentido ESE. No final desta pequena rampa chegamos a uma zona em que o algar alarga um pouco e vira no sentido E. Aqui o teto desce em relação ao inicio deste tramo e o chão é de alguma argila e alguns calhaus, paredes com alguma calcite e algumas formas de reconstrução, terminando um pouco à frente com uma chaminé de 3m. Verifica-se um pouco antes, no sentido S, após vencermos um pequeno e apertado destrepe, uma pequena sala com algumas formas de reconstrução com chão de argila e algumas ossadas, terminando aí o algar.
Geologia:
A gruta aparenta ter um controlo estrutural por duas famílias de fraturas de direção grosseira NW–SE e NE-SW, com inclinação subvertical. As camadas regionalmente têm direção aproximadamente NW – SE e inclinação suave para Sul. A gruta desenvolve-se em calcários da formação de Calcários Micríticos da Serra de Aire, datada do Batoniano do Jurássico Médio.
 
O poço de entrada aparenta tratar-se de um “vadose shaft” de acordo com a definição de Baron, 2003, apresentando caneluras de dissolução, o resto da cavidade não permite grandes ilações.
Presente:
Não se pense que foi só chegar aqui e “ver e vencer”! Foram várias saídas desde a identificação do algar até à sua exploração, captação de imagens e topografia. E valeu bem o esforço, pois é aqui que nos sentimos bem, no terreno.
Figura 3a - Planta do Algar do S
Figura 3a - Planta do Algar do S
Figura 3b - Perfil desdobrado do Algar do S
Figura 3c - Ficha de equipagem do Algar do S
Fotos do Algar do S por Rute Santos (GEM)

Buraco do Zé de Gatas

Ali bem perto, encontrámos um pequeno buraco que registamos apenas, pois vamos encontrando alguns assim na prospeção.
Sendo as coordenadas: (WGS 84)  39.50500ºN  8.80465ºW.
Figura 4 - Entrada do Buraco do Zé de Gatas (Foto: Paulo Lopes - GEM)
Algar Tudo Legal
Descemos e voltámos a subir um pouco, e chamou-nos a atenção uma fenda muito bonita com as heras a darem-lhe um toque especial…
Figura 5 – Entrada do Algar Tudo Legal (Foto: Rute Santos – GEM)
Descrição:
O algar abre-se à superfície numa fenda no sentido N com a largura aproximadamente de 1m, seguindo-se um pequeno ressalto e desce em rampa cerca de 3m. Segue-se um poço de 6m, aqui já com teto a cobrir a progressão. Em frente encontramos um bloco entalado entre as paredes e em baixo pequenos ressaltos até chegarmos à base do poço.
A base é de muito calhau e argila, as paredes são de uma calcite branca que se esta a desfazer, alias todo o algar é assim. O teto volta a subir encostando praticamente à superfície, inclusive verifica-se uma pequena entrada. Esta zona desenvolve-se no sentido NE. Já no sentido S, por de baixo de um ressalto, temos uma fenda onde se vê um oco com fundo de argila, terminando um pouco à frente. No sentido NNO, depois de subirmos um ressalto de 2m, encontramos uma fenda de boa altura mas que vai estreitando à medida que se avança, terminando um pouco mais à frente o algar.
Geologia:
A gruta aparenta ter um controlo estrutural por uma família de fraturas de direção grosseira N-S, com inclinação subvertical. As camadas regionalmente têm direção aproximadamente NW–SE e inclinação suave para Sul. A gruta desenvolve-se em calcários da formação de Calcários Bioclásticos do Codaçal , datada do Batoniano do Jurássico Médio.
A gruta aparenta tratar-se de um “vadose shaft” de acordo com a definição de Baron, 2003, apresentando caneluras de dissolução, sendo estas grutas com desenvolvimento essencialmente vertical que conduzem a água do epicarso para as zonas mais profundas do carso. De notar a proximidade da gruta, algumas dezenas de metros, a uma das falhas de direção WNW-ESE, com preenchimento dolerítico que cortam o Planalto de Stº. António.
Presente:
Pequeno mas de muito trabalho, as paredes são forradas de uma calcite que se esta a desfazer, mas tivemos com muita calma ao mais alto nível.
Figura 6a - Planta do Algar Tudo Legal
Figura 6a - Planta do Algar Tudo Legal
Figura 6b - Perfil desdobrado do Algar Tudo Legal
Figura 6c - Ficha de equipagem do Algar Tudo Legal
Fotos do Algar Tudo Legal por Rute Santos (GEM)

Algar do Jalles

Este algar já foi alvo de trabalho, tendo sido descoberto por Álvaro Jalles (AES), e na altura foi feita uma exploração e a respetiva topografia, topografia essa que fez com que procurássemos algo mais, não só por ter potencial como pela sua localização.
Figura 7 - Entrada do Algar do Jalles (Foto: Bruno Enes - GEM)
Figura 8 - Topografia total do Algar do Jalles, fruto do trabalho então efetuado.
Figura 8 - Topografia total do Algar do Jalles, fruto do trabalho então efetuado.
Existe também uma publicação no site do N.A.L.G.A., que pode ser visto copiando este link: Algar do Jalles – quando se topografa duas vezes
Descrição:
O algar abre-se à superfície num campo de lapiás bem característico da região. Numa depressão que quase faz uma circunferência eis a abertura com cerca de 1,5m x 1,5m, aproximadamente. Segue-se um poço de 12m, abre um pouco à medida que se desce e começa-se a perceber o sentido de orientação da cavidade. A base é de muito calhau e argila.
 
No sentido NO temos uma pequena abertura já identificada em 2012, que após desobstrução nos leva a uma passagem estreita descendo no sentido de progressão, com muita argila nesta zona. Segue-se um pequeno espaço com cerca de 9m x 1m, aproximadamente em que tanto o tecto como o chão são irregulares, mas na zona final formas de reconstrução diversas e muito bonitas, com pequeno gours e algumas perolas de gruta, terminando ai esse tramo.
 
De regresso a base do poço e agora seguindo no sentido SE, o algar continua, descendo no sentido de progressão numa zona de muito bloco e argila, o tecto baixa voltando a subir um pouco, até se chegar a novo poço de 28 m. Aqui encontramos algumas formas de reconstrução o poço é muito bonito e alarga um pouco na descida, verifica-se no sentido NO, descontinuidade preenchida de blocos e argilas, já no sentido SE verifica-se muitas formas de reconstrução parietais, a cerca de 18 m de descida de poço um patamar, o poço continua agora mais estreito terminando numa base replete de blocos e cascalheira onde se sente uma ligeira frescura mas sendo uma desobstrução “hercúlea”, termina ai a progressão. Já no patamar acima o algar desenvolve-se mais um pouco no sentido SE, zona de chão e tecto irregulares em que no final se verifica chaminé repleta de formas de reconstrução terminando ai o algar.
 
Verificou se a presença de salamandras e um pequeno sapo. Identificamos também pequenos frascos com produtos químicos que retiramos para colocar no lixo.
Geologia:
O algar do Jalles, segundo a Folha 27-A da Carta geológica de Portugal à escala 1/50000, desenvolve-se na formação de Calcários bioclásticos do Codaçal datadas do Batoniano (Jurássico Médio) e com elevado potencial de carsificação.  De referir a proximidade do algar a uma das falhas, intruidas por rochas ígneas, de direção aproximada NW-SE que cortam o planalto.
 
A gruta pode ser classificada como um “vadose shaft” de acordo com a definição de Baroñ, 2003. O controlo estrutural do desenvolvimento da gruta é feito por descontinuidades cujas famílias têm atitude N50W/Vertical. A atitude local das camadas é subhorizontal (a medição foi realizada no interior da gruta). As paredes dos poços apresentam caneluras de dissolução típicas de “vadose shafts”.
Presente:
Foi graças ao trabalho efetuado pelos nossos amigos, publicado na antiga topografia, que voltámos ao algar do Jalles e ainda bem pois desvendámos mais um pouco do algar e melhorámos agora a topografia já com outros métodos. E é sempre bom reviver aventuras e perceber a dificuldade que é desbravar o desconhecido.
Figura 9a - Planta do Algar do Jalles
Figura 9b - Perfil desdobrado do Algar do Jalles
Figura 9c - Ficha de Equipagem do Algar do Jalles
Fotos do Algar do Jalles por José Ventura (GEM), Filipe Castro (GEM) e José Ribeiro (GEM)

Buraco das Bolotas

Mais um buraco que fica aqui registado, estávamos por perto e fomos verificar, sendo as coordenadas (WGS 84)  39.50851ºN  8.81958ºW.
Figura 10 - Entrada do Buraco das Bolotas (Foto: Filipe Castro - GEM)

Algar das 2 Salas

A este chegámos graças à partilha das coordenadas pelo António Afonso (ARCM), que está sempre pronto a colaborar. Grande Tó, assim é que é, e valeu bem o tempo…
Figura 11 – Entrada do Algar das 2 Salas (Foto: José Ventura – GEM)
Descrição:
Numa zona de lapiás, um bom abatimento bem visível nas proximidades abre o algar à superfície. Observam-se duas aberturas separadas por um grande bloco e argila, uma muito estreita e outra mais a N, por onde se consegue passar. Tem cerca de 1,5m x 0,30m na sua zona mais “acessível”, seguindo-se um poço de 3m, meio em destrepe. Por aí chegamos a um pequeno “oco” com chão de muita cascalheira e argila e teto irregular onde são bem visíveis as aberturas das entradas. A NE verifica-se uma passagem que liga a outra zona do algar. No centro temos um poço de 13m, largo com paredes lisas, ficando mais estreito sensivelmente a meio e existindo um primeiro patamar que dá acesso a outro tramo. Até a base do poço volta a estreitar notando-se alguns abatimentos e a 3m da base o segundo patamar com bloco entalado. A base é de inclinação no sentido ONO, tem blocos inicialmente e termina em argila na zona mais a ONO.
Regressando ao primeiro patamar, seguimos no sentido N por uma passagem em poço de 3m com paredes e tetos ricos em formas de reconstrução, até aparenta termos entrado noutro algar. A base com umas belas e gordas estalagmites, paredes forradas de calcite tornando a zona muito bonita. Ao aproximarmo-nos a NNE o teto sobe, verificando-se aí a ligação à zona de entrada do algar. Um pouco mais a frente a zona abre consideravelmente, sendo na sua maioria a cabeceira de um poço de 6m. Do outro lado encontra-se um patamar dividido com um bloco que já se encontra concrecionado dando um ar muito belo. As paredes do poço são de calcite e a base é de argila. A SO existe uma passagem para uma pequena sala, sendo esta preenchida com blocos de várias dimensões, terminando aí o algar.
Geologia:
A gruta aparenta ter um controlo estrutural por duas famílias de fraturas de direção grosseira NW-SE e NE-SE com inclinação subvertical. As camadas regionalmente têm direção aproximadamente NW–SE e inclinação suave para Sul. A gruta desenvolve-se em calcários da formação de Calcários Mícriticos da Serra de Aire, datada do Batoniano do Jurássico Médio.
 
A gruta aparenta tratar-se de um “vadose shaft” de acordo com a definição de Baron, 2003, apresentando caneluras de dissolução, sendo estas grutas com desenvolvimento essencialmente vertical que conduzem a água do epicarso para as zonas mais profundas do carso.
Presente:
Que belo local e que algar espetacular, o mesmo algar e dois tramos tão distintos. Foi um fantástico dia, ficámos bem frescos pois a chuva não deu tréguas, mas valeu bem a pena e já se encontra cadastrado e agora aqui apresentado.
Figura 12a - Planta do Algar das 2 Salas
Figura 12b - Pormenor da sobreposição de poços e patamares
Figura 12c - Perfil desdobrado do Algar das 2 Salas
Figura 12d - Ficha de equipagem do Algar das 2 Salas
Fotos do Algar das 2 Salas por José Ventura (GEM)
Siga, mais uma publicação conseguida com o esforço de todos que têm participado das diversas formas.
 
Texto: José Ribeiro
Geologia: Paulo Rodrigues
Edição: Vitor Toucinho